segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Ser a mudança que queremos no mundo

Mahatma Gandhi era um homem com ideias, defeitos e limitações, mas provou que não é necessária uma revolução armada para construir uma mudança. O importante para ele sempre foi ser. Ser e agir como pensamos. Ser a mudança que queremos para o mundo.

Sobre ser, vou contar algo que tenho presenciado há 10 anos. As pessoas têm variadas visões sobre o vegetarianismo. Para mim, vegetarianismo não é só uma escolha gastronômica, é um movimento. É um ato ativista ambientalista, político-social que vai além da mera decisão de deixar de comer carne e derivados. É uma escolha pessoal. É optar pela não-agressão a animais, à terra, aos ecossistemas, ao ser humano. É escolher conscientemente dentre as variadas opções de consumo, aquela que é a mais justa, a mais solidária, aquela que provoque o menor sofrimento possível a toda a forma de vida existente.

Hoje é muito fácil ser vegetariano. A agricultura agroecológica veio prá ficar, é possível visitar os sítios desses agricultores. Eles produzem todo tipo de alimento, até galinha, boi, vaca, com o menor sofrimento.

Daí você tira que um ovolactovegetariano que compra tudo o que consome no mercado, sem se preocupar com a forma que o alimento foi produzido ou transportado, não é mais vegetariano que aquele que come ovos de galinha, Daquela caipira, criada solta, que bota ovo quando quer e não presa numa gaiola iluminada 24 horas por dia, a um nível de estresse desumano.

Não é mais vegetariano aquele que toma leite de soja de uma grande empresa como a Bunge que contamina as produções dos pequenos agricultores com pólen transgênico, que forçou a liberação política dos transgênicos não porque acredita que a transgenia possa realmente diminuir o uso de insumos agrotóxicos, mas porque é mais lucrativa.

Esse vegetariano que toma leite de soja não é mais vegetariano que aquele que toma leite da vaca criada no pasto, tratada com carinho, com respeito e cuidado. Ordenhada com o mínimo de dor, respeitando sua produção natural.

O vegetariano que corre para a seção de orgânicos do mercado e paga seis reais numa alface embalada, a meu ver não é mais vegetariano que aquele que sabe o horário da feira agroecológica, conhece o nome dos produtores e compra a alface deles por um real.

(Só um adendo: agricultura orgânica é o primeiro passo para a cultura sem agrotóxico. A cultura realmente certificada sem agrotóxico é a agroecológica.)

O vegetariano não precisa se chamar de vegano, porque não precisa de rótulos, apenas de ação. O veganismo é um movimento impossível para os dias de hoje, a menos que você aceite viver isolado, sem transporte, sem facilidades industriais, plantando a própria comida, tecendo a própria roupa e construindo as próprias ferramentas, a própria morada, sem nada além das próprias mãos. Deve ser uma vida boa, apesar de dura, mas temo que para mim não sirva para a vida toda. Sou bicho do mato, preciso me forçar a conviver com os humanos, para viver com eles, para me humanizar.

Também seria difícil para mim colocar os animais num cercado com a alegação veganista de que nenhum deles deve trabalhar. Nós animais humanos trabalhamos, porque nos privar do convívio e da ajuda dos animais? Para quê tanto orgulho e radicalismo? Acredito que a evolução do pensamento nesse sentido deva ir para o convívio respeitoso com os animais, não seu isolamento de nossa sociedade.

Por fim, acredito na vida natural tal como Thoureau vivia. Ele se isolava numa cabana à beira do rio por meses, com um punhado de grãos e vivendo da caça. Quando é para a sobrevivência, a caça, a pesca artesanal é justa. É a luta pela vida, tão naturalmente aceita pelos animais no mar e nas florestas. Não devemos perverter o natural, mas não devemos nos resumir a sacralizá-lo, devemos apenas saber conviver respeitosamente com o natural, a natureza.

Cada um de nós somos a nossa própria consciência e provocamos a mudança, seja de ações, seja de pensamentos, que queremos no mundo. Não precisamos apregoar nossas ideias como se fossem leis, bater de casa em casa desrespeitando o pensamento alheio, gritando nos ouvidos de quem não quer ouvir. Em 10 anos de vegetarianismo, aprendi que as mudanças mais sólidas e duradouras são lentas e silenciosas. Vi pessoas se transformarem porque eu me transformei, sem que eu dissesse uma palavra pra promover o vegetarianismo.

Enfim, entendo perfeitamente que sim, é possível ser a mudança que desejamos para o mundo, sem ambições, sem megalomania, sem pregação de casa em casa, discursos acalorados, paranoia, hashtags, campanhas publicitárias apelativas cheias de celebridades ou mídias sociais.

É simples, simplesmente ser.

Nenhum comentário: